segunda-feira, 27 de outubro de 2008

2. As duas fases do romance de Machado de Assis.
Os romances de Machado de Assis costumam ser divididos em duas fases. Segundo o crítico e ensaísta Roberto Schwartz, no vídeo, a primeira fase, contém “romances considerados convencionais, tanto por manterem – se presos às características dos romances do século XIX como pela abordagem do contexto social”. É, por assim dizer, a fase romântica do autor. A segunda fase vem depois das crises epilépticas de Machado e é como se tivesse havido uma evolução espiritual do autor. Esta é a fase, chamada realista. Roberto Schwartz nos diz que é nesta fase que Machado de Assis “dá a pena (de escrever)” às elites do seu tempo, ironizando o autoritarismo e a sociedade senhorial. Aspectos formais de Memórias Póstumas de Brás Cubas e a segunda fase de Machado de Assis
Espaço: O Rio de Janeiro. A natureza do livro permite que o narrador dispense pouca atenção à paisagem. O que importa são as reflexões desenvolvidas ao longo dos capítulos, no mundo das elites, donas de escravos, em 1800; um ambiente em que predominava a preguiça e o descanso. Uma das raras descrições de paisagem: “O morro estava ainda nu de habitações, salvo o velho palacete do alto, onde era a capela”. (p. 121).Linguagem: o processo narrativo desse romance de Machado de Assis pode ser estudado a partir da elasticidade de sua estrutura. Claro está que ele apresenta começo, meio e fim, mas, já no início, Brás Cubas fala de sua morte, no meio fala de sua vida, e no final, remete – nos ao primeiro capítulo e encerra o livro. Nessa narrativa, o narrador inclui outros gêneros literários utilizando, por exemplo, cartas e pequenas histórias. Os capítulos são curtos e todos eles têm um título como que para orientar o leitor a não perder de vista as intenções do narrador. O estilo brincalhão e galhofeiro deste livro está aliado a uma linguagem em que as frases exigem muita atenção e reflexão. “Então, considerei que as botas apertadas são uma das maiores venturas da terra, porque, fazendo doer os pés, dão azo ao prazer de os descalçar”. (p.56)
Cosmovisão do autor: a visão do mundo de Machado de Assis engloba observação aguda e análise profunda da realidade. Isto ele faz, através do humor, carregado de ironia e, também, através de um pessimismo que, longe de ser marcado pelo desespero ou pela angústia, propõe de forma irônica que se desfrutem os pequenos prazeres que a vida possa trazer, já que é impossível ser completamente feliz. Uma das célebres digressões de Brás Cubas sobre o homem: “...é uma errata pensante...cada estação da vida é uma edição, que corrige a anterior, e que será corrigida também, até a edição definitiva, que o editor dá de graça aos vermes”. Esse modo de narrar, filosófico e cômico, aliado a outros elementos da narrativa, a linguagem e posição do narrador, por exemplo, transcorre em ritmo de Carnaval, o que levou o crítico José Guilherme Merquior a chamar o livro de “O romance carnavalesco de Machado”. Em Memórias Póstumas de Brás Cubas, brincadeiras e críticas se alternam para que o narrador execute sua crítica moral e, para isso, prevalecendo – se de fértil imaginação e laboriosa reflexão. Capítulos curtos e muitas digressões, através de constantes conversas com o leitor, são possíveis porque a estrutura desse romance é elástica, permitindo divertidas manobras. O simples fato de estar na boca de um narrador defunto a tarefa de narrar, permite que o autor abuse das críticas e dos comentários sobre o modo de vida dos homens de oitocentos, sem se comprometer. As relações todas entre as pessoas permitem vislumbrar a presença de um autor, pesando os fatos e as idéias. No vídeo, afirma o ensaísta e crítico literário Roberto Schwartz sobre o modo de Machado de Assis ver a realidade em suas obras da segunda fase: “Enquanto o Machado de Assis da primeira fase tinha uma visão de quem quer colaborar para ilustrar a sociedade, para aumentar o seu brilho, para torná–la mais civilizada, o da segunda fase dizia: isto aqui não tem remédio, isto aqui só tem cara de civilizado, na verdade é completamente bárbaro...” , antes ele havia dito sobre a primeira fase: “...não tem objeções ao modo de vida da sociedade brasileira, nem ao desejo de ascensão social) - .

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